Guilherme Athayde Ribeiro Franco (*)
No Brasil, nunca como nos nossos dias, a drug culture experimentou tamanha e nefasta expansão.
Os explosivos e altamente tóxicos “vapes” [cigarros eletrônicos] correm sério risco de ser aprovados no dia 20.8 p.f. pela CAE [Comissão de Assuntos Econômicos] do Senado [1] – e com norma permissiva de venda liberada na Internet.
De modo insidioso, o artigo 21 do P.L. [Projeto de Lei] nº 5.008/23, alusivo ao tema, principia com norma aparentemente proibitiva de marketing de cigarros eletrônicos pela rede mundial de computadores; para em um segundo momento se utilizar das expressões “sendo ressalvada a exposição e comunicação” (…) “em comércio eletrônico” com estrito controle de maioridade (…).[2]
Ou seja. Em franco retrocesso, no bojo do P.L. nº 5.008/23 haverá a publicidade, venda e distribuição dos dispositivos eletrônicos para fumar [DEFs] em meio virtual. Sendo certo que desde a edição da Lei 9.294/96 [que disciplina, dentre outras matérias, a propaganda de fumígenos] esse tipo de comércio é proibido. Quer dizer: cigarros só podem ser adquiridos em pontos de venda físicos, limitando-se qualquer exposição ou comunicação a tais estabelecimentos. Jamais no tal do e-commerce. [3] [4]
Detalhe: não se pretende de maneira alguma que essa arma química seja aprovada; tão somente se alertar o tamanho da tragédia, se além da legalização, vier no pacote a Vapeland na tela dos celulares.
Trinta e nove gramas [39 g – o mesmo que 39.999 mg] de THC [droga existente na Cannabis que pode vir no formato de gummie/jujuba ou no cigarro eletrônico] para pretenso consumo pessoal – quase que 100% liberados para criança e adolescente!!![5] [6]
Como a posse de tamanha quantidade de THC/Cannabis deixou de ser crime [por força de recente decisão do STF], não há mais o correspondente “ato infracional” – nos moldes do artigo 103 do Estatuto da Criança e do Adolescente.[7]
“Canteiros” de cebolinha, salsinha e psicoativos – ou “indoor”, com hidroponia e lâmpadas de LED nos apartamentos…
Seis plantas de Cannabis com a mesma presunção de consumo pessoal, pouco se importando a potencial concentração de THC da variedade escolhida.
Por exemplo, a potente “skank” – que pode concentrar 20% [ou até mais] de THC em suas flores e folhas. [8]
E claro… a cerveja continua “não sendo álcool” para fins de propaganda; largamente anunciada/vendida pela internet. Combustível principal das baladas e a “droga pediátrica” mais consumida por adolescentes. [9]
Até quando irá se ignorar o dever de absoluta proteção integral das crianças e adolescentes, previsto no artigo 227 da Constituição da República?
A “guerra” aos cérebros em formação vem de modo silencioso – sob um equivocado pretexto de se defender o garoto preto, pardo, periférico e pobre.
Quiçá se ouvíssemos as bombas lançadas em nossas ruas, teríamos melhor “percepção” quanto à necessidade [“prá” ontem] de se proteger as presentes e futuras gerações.
Seja a cor da pele branca, preta ou vermelha – as cores da bandeira de todos os paulistas, aqui nascidos ou adotados.
Campinas, 9 de julho de 2024.
Aniversário da Revolução Constitucionalista de 1932.
(*) 30º. Promotor de Justiça de Campinas/Associado da APMP [Associação Paulista do Ministério Público] e da ABEAD [Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas] /Especialista em Dependência Química pela UNIAD/UNIFESP. Caiçara do Litoral Sul – uma das regiões que está sendo assediada pela Cassinoland, prima-irmã da Drugland.
(**) todos os acessos aos “sites” aqui mencionados se deram na data da elaboração do texto.
Referências
– [1] https://www.youtube.com/live/gGeth4FMgNA
– [2] Art.21. São proibidas propagandas comerciais de cigarros eletrônicos independentemente do veículo, seja TV, rádio, outdoor, impresso e virtual, inclusive pelas redes sociais, sendo ressalvada a exposição e comunicação dos cigarros eletrônicos exclusivamente no interior do ponto de venda ou em comércio eletrônico com estrito controle de maioridade, nos termos desta lei. [Destaque nosso – Cf. https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=9481955&ts=1720546670261&disposition=inline]
– [3] Art. 3º É vedada, em todo o território nacional, a propaganda comercial de cigarros, cigarrilhas, charutos, cachimbos ou qualquer outro produto fumígeno, derivado ou não do tabaco, com exceção apenas da exposição dos referidos produtos nos locais de vendas […] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9294.htm
– [4] A norma do artigo 3º. está perfeitamente apoiada na Convenção Quadro de Controle de Tabaco [CQTC], em vigor no Brasil desde o Decreto Presidencial n. 5.658/2006 [após processo de internalização com a essencial aprovação do Senado], de clareza solar ao enfatizar a necessidade de se restringir e proibir o marketing da nicotina – e não que se esparramem os pontos de venda físicos e virtuais pelo país. [Cf. o seu artigo 13] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/decreto/d5658.htm
– [5] Para se ter uma ideia, 10 mg de THC é considerado como uma “dose padrão” a fim de se obter algum efeito psicoativo pelo usuário – https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC8221366/ ;
– [6] já a ingesta de 1.500 mg de THC pode matar. https://journals.lww.com/ajg/fulltext/2023/10001/s2983_intentional_ingestion_of_cannabis_vape_pen.284.aspx#:~:text=Moreover%2C%20the%20concentration%20of%20c
– [7] Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069compilado.htm
– [8] https://www.theguardian.com/society/2004/jan/18/drugsandalcohol.drugs2
– [9] Lembrando aqui a campanha institucional do MPSP e parceiros; perfeitamente válida em seus fundamentos e que mereceria atualização, aprimoramento e divulgação. https://criancaeconsumo.org.br/noticias/ministerio-publico-adverte-publicidade-de-cerveja-faz/