Por: Selene Franco Barreto

Atualmente, dispomos de muitas informações que nos permitem refletir e agir em prol da prevenção. É fundamental reforçar a importância da informação como ferramenta poderosa na prevenção do uso de substâncias psicoativas, abrangendo a saúde pública, a educação, a segurança e o bem-estar social.

O dia 26 de junho foi uma data de grande relevância, pois marca o Dia Internacional de Combate às Drogas. Neste contexto, é oportuno destacar a perseverança de entidades como os Alcoólicos Anônimos (AA), que em junho de 2025 completaram 90 anos de existência. No Brasil, o AA celebrará 78 anos em setembro de 2025. A importância dessa data e da atuação de organizações como o AA é sublinhada por dados alarmantes.

O último relatório das Nações Unidas (ONU), divulgado em 2025 (RELATÓRIO, 2025), revela a gravidade da situação global: substâncias ilícitas causaram a morte de 500 mil pessoas. A cannabis permanece como a droga mais consumida no mundo, com 244 milhões de usuários. O relatório também aponta que há 61 milhões de usuários de opioides, 30,7 milhões de anfetaminas, 25 milhões de cocaína e 21 milhões de ecstasy. Alarmantemente, o relatório indica que apenas uma em cada doze pessoas com histórico de dependência química recebeu alguma forma de tratamento em 2023.

Diante desse cenário, a fala do secretário da ONU, António Guterres, torna-se ainda mais relevante. Guterres destacou que programas de prevenção de drogas baseados em evidências podem proteger pessoas, famílias e comunidades e falou sobre a importância de estratégias de reabilitação e reintegração, campanhas de educação em saúde pública e o aumento do investimento em medidas de prevenção, tratamento e redução de danos relacionados às drogas, afirmando que “A prevenção compensa” (Nações Unidas, 2024).

A ciência da prevenção

A prevenção ao uso de álcool e outras drogas engloba uma série de ações, estratégias e políticas que visam evitar ou reduzir as consequências negativas do consumo dessas substâncias. Essas ações podem ser implementadas em diversos contextos, como saúde, escolas, comunidades, famílias e locais de trabalho, com o objetivo de proteger a saúde física, mental e social de todos.

A ciência da prevenção nos mostra que a prevenção eficaz vai além de simplesmente evitar o início do uso de substâncias. Ela também envolve a redução dos riscos e danos associados ao consumo, a promoção de comportamentos saudáveis e o desenvolvimento de habilidades para a vida. Além disso, é importante fortalecer os fatores de proteção, como laços familiares, autoestima e educação, e diminuir os fatores de risco, como violência, exclusão social e baixa escolaridade. A integração entre escola, família e comunidade é fundamental nesse processo.

O olhar para a prevenção como ciência faz com que esse campo avance e que abordagens mais eficazes sejam sempre baseadas em evidências, adaptando-se às realidades e necessidades específicas de cada comunidade. Isso inclui a promoção da saúde mental como um pilar fundamental da prevenção, reconhecendo a forte ligação entre bem-estar psicológico e a vulnerabilidade ao uso de substâncias. Além disso, as novas tecnologias e as mídias sociais desempenham um papel crescente, tanto na disseminação de informações de prevenção quanto no combate à desinformação, exigindo estratégias inovadoras para alcançar e engajar o público.

A prevenção em diferentes contextos

Prevenção na população geral

Dados do III Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (LENAD) (Laranjeira et al., 2024) revelam que o uso de substâncias psicoativas permanece elevado no Brasil. A pesquisa aponta que mais da metade da população adulta já consumiu bebidas alcoólicas em excesso e que cerca de 3% dos brasileiros apresentam critérios para dependência de álcool. O levantamento também destaca o avanço do uso de maconha, especialmente entre os jovens, e o crescimento do consumo de medicamentos com potencial de abuso, como os benzodiazepínicos e os opioides.

Esse cenário confirma e atualiza os alertas feitos por estudos anteriores, como o da Fiocruz (2019), que já indicava uso abusivo de álcool por mais de 30% da população e dependência em cerca de 4%. O III LENAD reforça a urgência de estratégias de prevenção baseadas em evidências, que considerem os fatores sociais, econômicos e de saúde mental envolvidos no uso problemático de substâncias.

CategoriaEstimativa de brasileiros (2023)Fonte
Usuários de álcool (últimos 12 meses)+ 70 milhões (≈44% da população)Vigitel / Fiocruz (2023)
Consumo abusivo de álcool (binge)Cerca de 50% da populaçãoIII LENAD (2024)
Dependência de álcoolCerca de 3% da populaçãoIII LENAD (2024)
Usuários de maconha (últimos 12 meses)3,9 milhões (últimos 12 meses)III LENAD (2024) / Ministério da Justiça
Usuários de cocaína/crack (uso recente)1,5 milhãoUNODC/Fiocruz
Dependentes químicos de drogas ilícitas  2 a 3,3 milhõesSENAD
Usuários de benzodiazepínicos e opioidesCrescimento significativoIII LENAD (2024)

Fonte: Elaborado pela autora.

Prevenção no trânsito

O consumo de álcool e outras substâncias psicoativas é um fator preocupante no trânsito. A Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta que cerca de 30% das mortes no trânsito no Brasil estão relacionadas ao consumo de álcool. Dados do Ministério da Saúde (Vigitel, 2023) mostram que 1 em cada 5 motoristas admite já ter dirigido após consumir álcool. Em 2023, o DataSUS registrou mais de 7.500 mortes por acidentes de trânsito associadas ao uso de substâncias. A Polícia Rodoviária Federal (PRF) também observa um aumento relevante e crescente no uso de maconha, cocaína e medicamentos sedativos nas rodovias.

Prevenção no ambiente de trabalho

No dia 27 de julho, celebra-se o Dia Nacional de Prevenção a Acidentes de Trabalho. Em 2025, o Brasil marca 53 anos da publicação das portarias n. 3.236 e 3.237, de 27 de julho

de 1972, que representaram um marco na proteção à saúde e segurança dos trabalhadores. Essas normativas ampliaram o conceito de acidente de trabalho, incluindo não apenas os eventos que ocorrem no ambiente laboral, mas também aqueles que acontecem durante o trajeto de ida e volta, como um acidente de trânsito enquanto o trabalhador se dirige para o trabalho ou retorna para casa.

Sob a perspectiva da prevenção, o uso de álcool e outras drogas no ambiente profissional também é um sério problema de saúde pública e segurança. Ele impacta diretamente a produtividade, a saúde física, mental e social dos trabalhadores e contribui para a ocorrência de acidentes ocupacionais, que muitas vezes são graves ou fatais. Em 2023, o Brasil registrou 612.920 acidentes de trabalho com 2.538 mortes, de acordo com o Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho (Ministério Público do Trabalho e OIT). Estima-se que até 20% desses acidentes estejam relacionados ao uso de álcool e drogas, especialmente em setores como construção civil, transporte, indústria e agronegócio.

O Relatório Global da OIT destaca que trabalhadores sob efeito de substâncias têm 2,7 vezes mais chances de sofrer acidentes. O INSS também registrou em 2023 cerca de 42 mil benefícios por incapacidade temporária devido a transtornos relacionados ao uso de substâncias psicoativas (CID F10-F19).

Prevenção nas escolas

O uso de álcool e drogas entre adolescentes é uma preocupação crescente, pois essa fase de desenvolvimento os torna mais vulneráveis aos efeitos nocivos das substâncias. A iniciação precoce está associada a maiores riscos de dependência, acidentes, evasão escolar e transtornos mentais. Dados do PeNSE (IBGE) para adolescentes entre 13 e 17 anos mostram que 55% já experimentaram álcool, 19% cigarros (inclusive eletrônicos/vape) e 7% maconha.

Programas de prevenção eficazes, segundo a UNODC e a OMS, devem ser contínuos e começar precocemente, envolvendo famílias, escolas e comunidades. Abordagens baseadas em evidências, como as validadas pela UNODC, são fundamentais.

Por que a prevenção é importante?

  1. Redução de danos à saúde: O uso abusivo de substâncias está ligado a diversas doenças físicas e mentais. Prevenir ou intervir precocemente reduz a chance de danos graves e mortes evitáveis.
  2. Prevenção e educação continuada ao uso precoce: Jovens e adolescentes são mais vulneráveis. Informações corretas ajudam a adiar ou evitar o início do uso, diminuindo os riscos de dependência no futuro. A prevenção começa em casa e tem continuidade nas escolas, onde os professores agem como multiplicadores de informações corretas, com base científica e oferecem acolhimento dos jovens.
  3. Combate ao estigma e à desinformação: Pessoas com problemas de dependência frequentemente sofrem preconceito. Informar é humanizar, reconhecendo a dependência como uma condição de saúde que exige cuidado, não punição.
  4. Promoção de escolhas conscientes: Com informação clara e consistente, as pessoas podem fazer escolhas mais seguras e responsáveis sobre seu estilo de vida.
  5. Apoio à família e à comunidade: Famílias informadas podem identificar sinais precoces e buscar ajuda. Comunidades preparadas promovem ambientes mais saudáveis e acolhedores.
  6. Atenção às nossas adversidades (mulheres, etnias, LGBTQIAPN+): É importante reconhecer que a prevenção deve ser equitativa e inclusiva. Grupos em situação de vulnerabilidade social, econômica ou psicológica frequentemente enfrentam fatores de risco adicionais para o uso de substâncias e barreiras no acesso a informações e tratamento. Programas de prevenção devem ser desenhados para atender às necessidades específicas dessas populações, oferecendo apoio psicossocial, oportunidades e acesso facilitado a serviços de saúde, garantindo que ninguém seja deixado para trás na luta contra a dependência.
  7. Redução de custos sociais e econômicos: O uso de risco e o Transtorno de Substância (TUS) geram altos custos para os sistemas de saúde, segurança pública e previdência. A prevenção é mais econômica e eficaz do que o tratamento das consequências.
  8. Fortalecimento das políticas públicas: A conscientização da população impulsiona a criação e manutenção de políticas públicas eficazes, como programas escolares, CAPS-AD e campanhas educativas.

A prevenção é um investimento no futuro de cada indivíduo e da sociedade como um todo. Ao compartilharmos conhecimento e promovermos ambientes seguros, estamos construindo um caminho para uma vida mais saudável, consciente e feliz. Nestes dias, podemos refletir e buscar mudanças e assim reafirmamos nosso compromisso com a disseminação de informações e a promoção de ações preventivas, essenciais para transformar a realidade e garantir um futuro com menos danos e mais oportunidades.

O futuro só chegará se, no presente, a prevenção você adotar.

Rio de Janeiro, 07 de agosto de 2025.

Selene Franco Barreto

CRP: 13.631-05

Psicologa Clínica e Consultora de Empresa

Presidente da ABEAD 2023/2025

secretaria@abead.com.br

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