Por Rogério Adriano Bosso. Psicólogo. Especialista em Dependência Química pela UNIFESP e associado de São Paulo da ABEAD.

 

Infelizmente, para algumas famílias, a dependência química se torna uma realidade trágica, afetando não só a pessoa que faz uso de substâncias, mas a família como um todo. Em casos graves, cuja severidade que coloca o dependente químico em riscos, inclusive de morte, a internação pode ser um dos caminhos para frear a compulsão e o uso, dando a oportunidade para o indivíduo de resgatar sua condição psíquica de forma que possa avaliar sua realidade atual, a complexidade do uso, bem como suas consequências, e a partir de então, poder decidir e fazer escolher de forma mais saudável. Assim como a dependência química é complexa, o dependente químico possui variadas necessidades de cuidados. Para se pensar na escolha de um bom lugar para a internação, precisamos ter em mente que a internação não é o único setting de tratamento disponível e nem sempre o primeiro a ser selecionado. Existe a necessidade de se avaliar, preferencialmente por uma equipe multidisciplinar, uma série de questões, entre elas o suporte familiar, as condições clínicas do indivíduo, o estágio motivacional e os riscos para si para terceiros, por exemplo, para a tomada de decisão.

Sabemos que esse é um momento deliciado para os familiares e, caso encontre dificuldade para realizar essa avaliação do local que está ofertando o tratamento para dependência química, vale a pena recorrer a associações credenciadas ou órgãos apoiadores, regulatórios e fiscalizadores, tais como a ANVISA ou CRMpara obter mais informações sobre os estabelecimentos. Internar o familiar em qualquer lugar, sem uma avaliação prévia do serviço, pode ter um custo alto. Existem bons lugares capazes de acolher os dependentes químicos que necessitam de ajuda, mas é preciso avaliar, sempre!

No entanto, todos os modelos precisam apresentar uma metodologia adequada para alcançar bons resultados. Iremos verificar as formas de observar essa metodologia, a seguir.

  1. Antes de recorrer a internação, deve-se lançar mão das tentativas em meio aberto, comunitário ou ambulatorial, como por exemplo, o CAPS AD, ou o CAPS disponível na sua cidade, caso a cidade não conte com um CAPS exclusivo para as demandas de problemas relacionados ao uso do álcool e outras drogas. O CREAS, os Hospitais Gerais, os Ambulatórios de Saúde Mental e os profissionais da rede privada que são especialistas na área e que possuem um atendimento integrado com outros profissionais podem ser opções de busca para o tratamento em meio aberto;
  2. Mesmo com toda essa gama de opções, como já mencionado, em alguns casos, a dependência já comprometeu o indivíduo, de forma a estar causando prejuízos em várias áreas da vida do usuário, impedindo o mesmo de ter suas relações afetivas saudáveis, trabalho e desempenhar seus diferentes papéis sociais, como o de ser pai, mãe, filho, tio, amigo, etc. e então, se faz necessário a internação;
  3. O familiar deve entender que nem todos os lugares para internação servirá para todos os casos. Para tanto, precisa verificar junto ao profissional médico a realização de uma avaliação inicial, onde identificará a gravidade do caso e dirá se aquele, de fato é o local adequado para encaminhamento a fim de atender as necessidades daquele momento. Por exemplo, indivíduos com comprometimentos clínicos, como diabetes descompensada, hipertensão arterial sistêmica descompensada, em vigência de desnutrição, desidratação ou tuberculose ativa são melhores tratados em hospital geral.
  4. Deve-se verificar se o local está em conformidade e seguindo as orientações dos órgãos públicos sanitários e órgãos fiscalizadores para o funcionamento do mesmo. Melhor ainda se o local possui alguma acreditação de certificações que buscam por meio de padrões e requisitos previamente definidos, promover a qualidade e a segurança da assistência no setor de saúde.
  5. Outro ponto importante é verificar se existe uma equipe multidisciplinar capacitada capaz de desenhar o programa terapêutico de tratamento e realizar as atividades que são propostas nesse programa e se existe uma transparência desta equipe, com seus respectivos currículos através de site e/ou currículo lattes. Procurar saber qual é o programa terapêutico oferecido e se este está baseado em evidências científicas e boas práticas clínicas.
  6. Verificar se existe um responsável técnico no local, o qual deve ser um profissional com nível superior e especialista na área da dependência química ou saúde mental, preferencialmente médico.
  7. Indagar sobre como são feitas as avaliações para verificar a evolução do indivíduo no tratamento, tempo de internação, critérios para alta;
  8. Os serviços, como todos os locais, devem ter normas e regras, sendo assim, devem apresentar regras para as visitas, mas nunca apresentar privação de contato da pessoa com o familiar ou privação de ligação do paciente para sua família;
  9. Verificar se o tratamento atende o indivíduo em sua totalidade e não apenas nas demandas relacionadas à dependência química, pois para a eficácia do tratamento é necessário um tratamento que aborde o indivíduo como um todo;
  10. Questionar sobre o período de tratamento e verificar se o tempo de permanência está em conformidade com a evolução do indivíduo.

 

FONTES:

DH – Department of Helath (UK) (2017). Drug misuse and dependence – UK guidelines on clinical management. London: DH.

Lourenço, J. H. C., et al, 2020. Avaliação inicial e processo de triagem para pessoas com transtornos por uso de substâncias. In: O Tratamento da Dependência Química: um guia de boas práticas. Rogério Adriano Bosso (org.) & Juliano Pereira dos Santos (org.). Edição. Curitiba: Appris. p. 38-40.

National Institute on Drug Abuse (NIDA). (1999). Principles of drug addiction treatment A research-based guide. National Institutes of Health U.S. Department of Health and Human Services.

SAMHSA – Substance Abuse and Mental Health Service Administration (2006). Substance abuse: clinical issues in intensive outpatient treatment. Rockville: DHHS.

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