Nota de Repúdio – A interferência política e desmonte da coordenação da Comissão Nacional para a Implementação da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco (CONICQ).
Segundo informações divulgadas pela mídia em 15 de fevereiro de 2022.

Desde a divulgação por ordem judicial dos documentos internos da indústria do tabaco, na década 90, houve um esforço de mais de 100 países para construir o maior tratado de saúde pública mundial chamado de Convenção-Quadro. O Brasil cooperou ativamente na elaboração deste tratado internacional que engloba medidas todas elas muito relevantes. Contempla a promoção de ambientes livres de fumo, no intuito de proteger a saúde de todos garantindo atenção como dever do Estado ao cuidado da saúde pública. Aborda temas como regulação de propaganda, publicidade, patrocínio, advertências em embalagens e tabagismo passivo. Merece especial destaque o incentivo financeiro a agricultores dependentes da indústria do tabaco para a troca do cultivo de produtos fumígenos por culturas alternativas sustentáveis.

Dentro deste contexto, foi criada a Comissão Nacional para o Controle do Uso do Tabaco. Foi composta por nove Ministérios, o que possibilitou ações importantes como a inserção obrigatória de advertências sanitárias nas embalagens, proibição do trabalho de menor de 18 anos na produção do fumo e a proibição da utilização do crédito público do Programa Nacional de Agricultura Familiar para a produção de fumo.

Após o Brasil assinar o compromisso de implementar a Convenção-Quadro, a Comissão substituiu seu caráter consultivo e passou a incorporar uma função executiva. Tornou-se assim responsável pela coordenação nacional que inclui implementação, monitoramento e estudo das medidas de controle do tabagismo no país. Junto com a mudança nas atribuições, passou a se chamar Comissão Nacional para Implementação da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco e de seus Protocolos (CONICQ). Destaque-se que sempre foi ligada ao Ministério da Saúde (gabinete ao qual de fato pertence e do qual não deveria sair). Após a ratificação da Convenção-Quadro pelo Brasil, em 2004, o tratado adquiriu status de lei ordinária. Estabeleceu-se a observância de que não se pode desrespeitar o artigo 5.3 que trata de conflito de interesses por parte da indústria do tabaco dentro da Comissão.

Da mesma maneira e pela mesma razão de lei ordinária, a CONICQ não pode ser desconsiderada no país que estabeleceu acordos e compromissos internacionais nesta área. Esta pauta já está confirmada pelo parecer jurídico do Ministério da Saúde e da Advocacia Geral da União, independentemente de novo decreto contrário sancionado pelo atual presidente do Brasil em 2019.

Com os esforços incansáveis da CONICQ junto a parceiros da sociedade civil, o Brasil passou a ser destaque mundial pela queda importante na prevalência do tabagismo. Obteve também o maior êxito na prevenção das mais de 50 doenças tabaco-relacionadas, atreladas à indústria que ainda mata mais de 8 milhões de pessoas por ano, em decorrência do tabagismo.

Com a coordenação da CONICQ, conquistamos importantes marcos. Ocorreu ampliação dos Programas de Tratamento do Tabagismo nas Clínicas de Família, treinamento recorrente de profissionais, e elaboração de Diretrizes de Tratamento com as melhores recomendações. Pela participação em reuniões internacionais, como a Conferência das Partes da Convenção-Quadro, defenderam-se medidas importantes para o Brasil, como é o combate ao comércio ilícito. Mais ainda, conseguimos tornar o Brasil um dos primeiros países, com mais de 100 milhões de habitantes, a ter ambientes fechados e semifechados 100% livres de fumo, em todo o território nacional. Mais ainda, tornamos o Brasil um dos poucos a oferecer tratamento totalmente gratuito, dentro do âmbito do sistema de saúde em todo território nacional. Tal pioneirismo não seria possível sem a coordenação e vanguarda da CONICQ.

Por isso, foi com imensa preocupação e indignação, que soubemos de planos de desmonte e extinção da CONICQ, através da matéria intitulada “Deputado diz ter ‘combinado’ com Onyx extinção de comissão antitabaco”. Ela foi publicada em 15 de fevereiro de 2022, no portal de notícias UOL. O desmonte foi também noticiado por vídeos divulgados pela mídia. Ambos explicitam claramente os propósitos do Deputado Federal Marcelo Moraes (PTB-RS), o qual parece apresentar conflitos de interesse relacionados ao cultivo e à indústria do tabaco.

Apesar dos grandes avanços obtidos, os produtos de tabaco ainda geram prejuízos de cerca de 40 bilhões à nação, restando, portanto, muito trabalho a se fazer. Julgamos que interesses econômicos pontuais não devem prevalecer ou justificar tal descaso, já que uma nação com saúde é a primeira condição para prosperidade.

A Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (ABEAD) espera o apoio dos deputados, senadores, dos órgãos governamentais ligados à política nacional de álcool e outras drogas, na qual o tabaco está incluído. Ademais, e não menos importante, o Brasil precisa do compromisso de toda a sociedade civil para retificar esse equívoco. É preciso expor toda nossa indignação e opor toda a resistência à diligencia empreendida vigorosamente pelo Sr. Deputado Federal Marcelo Moraes (PTB- RS). Reiteramos a importância de que se apurem possíveis ilícitos que possam ter ocorrido com as tentativas de interferência política relatadas na matéria e a publicação do Plano de Fortalecimento do Programa Nacional de Controle do Tabaco. Finalizando, defendemos veementemente que seja aprovado o decreto que torna a CONICQ formalmente integrada ao Ministério da Saúde, garantindo que siga exercendo seus melhores préstimos à sociedade brasileira.

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