Por Aline Coraça

Processo de recuperação:

O momento em que o indivíduo está, ou seja, seu estágio motivacional, também influencia no processo de recuperação. Vários fatores influenciam positiva ou negativamente no processo de recuperação.

É no estágio motivacional de manutenção, que, em sua grande maioria, se encontrarão os indivíduos que estejam em processo de recuperação.

A necessidade de consumir algum tipo de substância diminui gradativamente e o desafio é manter-se em abstinência. Todavia pode ser comum a experiência da recaída e retorno aos estágios motivacionais anteriores, até que o indivíduo consiga atingir a manutenção permanente.

Pode-se entender o lapso como o uso esporádico de algum tipo de substância e recaída como o retorno ao padrão de uso anterior ao início do tratamento. É crucial que os profissionais que trabalhem com indivíduos acometidos por transtornos por uso de substâncias saibam distinguí-los.

Sabe-se que uma das principais razões da recaída é uma vida desequilibrada, que se deve basicamente a dois aspectos:

  1. desequilíbrio entre deveres e lazer (sobrecarga – quando os deveres se sobrepõem aos desejos) e
  2. estresse (grandes eventos ou pequenos aborrecimentos, dificuldade de lidar com os estressores).

Identificar situações de risco, aprender a enfrentá-las e mudar o estilo de vida são ações que contribuem para a manutenção da mudança de comportamento.

Uma vez abstinente, é importante que o indivíduo reestruture sua rotina, suas atividades e sua rede social (manutenção da mudança de comportamento).

A (re) estruturação de rotina possibilita o terapeuta ocupacional incluir na vida dos indivíduos o hábito de engajar-se em atividades significativas, que vão promover sensação prazerosa de bem-estar, possibilitando o engajamento ocupacional.

Entretanto, estruturar uma rotina vai muito além de criar uma tabela com lista de atividades, isso qualquer um pode fazer e está muito longe de ser uma estratégia de intervenção exclusiva do terapeuta ocupacional com impacto no cotidiano do indivíduo e de seus familiares.

Utilizar essa ferramenta exige muito estudo científico e muita “técnica baseada na ocupação” para compreender a importância e significado do uso do tempo e dos padrões de desempenho ocupacional para qualidade de vida dos indivíduos. Exige uma avaliação aprofundada do histórico ocupacional.

A ANAMNESE DO DESEMPENHO OCUPACIONAL abrange:

  • Ocupações (ABVDs, ABIVDs, descanso e sono, educação, trabalho, brincar, lazer, participação social)
  • Fatores (valores, crenças, espiritualidade, funções e estruturas do corpo)
  • Habilidades de desempenho (motoras, de processo, interação, social)
  • Padrões de desempenho (hábitos, rotinas e papéis ocupacionais)
  • Contextos e ambientes (cultural, pessoal, físico, social, temporal, virtual)

Muitas profissões usam um processo semelhante de avaliação, intervenção e análise dos resultados. No entanto, apenas os profissionais de terapia ocupacional focam no uso de ocupações para promover a saúde, o bem-estar e a participação na vida.

A análise do desempenho ocupacional requer a compreensão da interação complexa e dinâmica entre os fatores, as habilidades e padrões de desempenho, os contextos e ambientes, juntamente com as exigências da ocupação da atividade a ser realizada.

Os terapeutas ocupacionais devem se atentar a cada um desses aspectos e avaliar a influência entre eles. Devem analisar também, de forma dinâmica, os papéis ocupacionais desempenhados pelo indivíduo.

  • Quão efetivo e interessado ele é no desempenho de um determinado papel?
  • Como os papéis estão sendo desempenhados na rotina e quais são os hábitos que o compõem?
  • Existem hábitos que apoiam ou prejudicam o desempenho do papel?
  • Quais habilidades apoiam e quais restringem o desempenho dentro de um papel?
  • Como o entorno facilita ou inibe um determinado papel?

O planejamento da intervenção deve ser traçado juntamente com o indivíduo, considerando seus desejos, interesses e potenciais para desenvolver e/ou recuperar papéis ocupacionais.

É necessário levar em consideração os desempenhos e habilidades que estão envolvidos, para que o terapeuta ocupacional possa (re) organizar suas tarefas dentro de uma rotina diária, com comportamentos guiados por papéis e hábitos saudáveis, de forma a produzir resultados ocupacionais significativos para ele e, com isso, minimizar os riscos para lapsos e recaídas.

Fonte:

  1. BOSSO, R. A., 2020. Estruturação de programas de reinserção social para pessoas com transtornos por uso de substâncias. In: O Tratamento da Dependência Química: um guia de boas práticas. Rogério Adriano Bosso (org.) & Juliano Pereira dos Santos (org.). Edição. Curitiba: Appris.
  2. Ferreira, A. C. Z., Capistrano, F. C., Souza, E. B., Borba, L. O., Kalinke, L. P. & Maftum, M. A. (2015). Drug addicts treatment motivations: perception of family members. Rev Bras Enferm; 68(3): 415-22. DOI: http://dx.doi. org/10.1590/0034-7167.2015680314i.
  3. SEREBRENIC, F.,2018. Prevenção de recaída. In: O tratamento da dependência química e as terapias cognitivo-comportamentais: um guia para terapeutas. Neide A. Zanelatto, Ronaldo Laranjeira (org.). 2. ed. –  Porto Alegre: Artmed, 2018.
  4. AOTA – AMERICAN OCCUPATIONAL THERAPY ASSOCIATION. Occupational therapy practice framework: domain and process (2nd). American Journal of Occupational Therapy, v. 62, n. 6, p. 625–683, 2015.
  5. CRUZ, D.M.C.C., 2021. O Modelo da Ocupação Humana: teoria e avaliação da participação, funcionamento e papel ocupacional. In: Terapia Ocupacional em neuropsiquiatria e saúde mental. Adriana Dias Barbosa Vizzotto (org.) & Alexandra Martini de Oliveira (org.). 1. ed. – Santana de Parnaíba (SP): Manole, 2021.

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