Quase 92.000 pessoas morreram de overdose de drogas nos EUA em 2020, com aumento em mulheres negras não hispânicas.
Muitas pessoas que têm um transtorno por uso de substâncias também desenvolvem outras doenças mentais, como por exemplo, os transtornos de humor, bipolaridade e ansiedade, os quais estão independentemente associados ao aumento do risco de suicídio. O suicídio é um fenômeno complexo e multifatorial, que pode afetar indivíduos de diferentes origens, classes sociais, idades, orientações sexuais e identidades de gênero. Além disso, muitas pessoas diagnosticadas com outras doenças mentais são frequentemente diagnosticadas com problemas por uso de substâncias, o que reforça a necessidade de abordar ambas as condições de saúde mental concomitantes e de forma abrangente com vistas a diminuir o suicídio.
Um novo estudo americano publicado no The American Journal of Psychiatry agora em 2022 pelo grupo da Dra. Nora Volkow presidente do National Institute on Drug Abuse trouxe dados bastante interessantes sobre as mortes intencionais por overdose de drogas, ou suicídios por overdose. Este estudo encontrou um declínio geral nos últimos anos nos Estados Unidos, mas um aumento em jovens de 15 a 24 anos, idosos de 75 a 84 anos, e mulheres negras não hispânicas. O estudo também descobriu que as mulheres eram consistentemente mais propensas do que os homens a morrer de overdose intencional de drogas, com as taxas mais altas observadas em mulheres de 45 a 64 anos. Além disso, fatores como época do ano, duração do dia e dia da semana parecem estar associados a taxas de mortalidade por overdose intencional. Quase 92.000 pessoas morreram de overdose de drogas nos EUA em 2020. Isso representa o maior aumento já registrado em um ano e reflete um aumento de quase cinco vezes na taxa de mortes por overdose desde 1999. Cerca de 5% a 7% destes as mortes por overdose são registradas como intencionais. Como pode ser difícil determinar se as mortes por overdose são intencionais, os números reais provavelmente são ainda maiores.
No Brasil, os dados de monitoramento sobre o suicídio felizmente têm melhorado nos últimos anos. No entanto, muito provavelmente seguem ainda subestimados. Não há artigos publicados recentemente no país sobre suicídio por overdose de drogas que dão conta de dimensionar o tamanho real desta questão por aqui. No entanto, em 2016, a taxa de suicídio no Brasil chegou a 5,8 por 100 mil habitantes, com a notificação de 11.433 mortes por suicídio. As mulheres representaram quase 70% (153.745) do total de tentativas de suicídio por intoxicações exógenas nos 11 anos avaliados.
“O uso de substâncias por mulheres apresenta desafios distintos daqueles apresentados pelo homens.”
Segundo a Dra. Alessandra Diehl, psiquiatra presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (ABEAD) “o uso de substâncias por mulheres apresenta desafios distintos daqueles apresentados pelo homens”. Ela nos informa que existem uma convergência de evidências sugere que as mulheres com dependência química são mais propensas do que os homens a enfrentar várias barreiras que afetam o acesso e a permanência delas no tratamento para a dependência química, tais como: baixa percepção da necessidade de tratamento; culpa e vergonha; transtornos comórbidos; disparidades econômicas, laborais e de seguro saúde; responsabilidades de cuidados infantis e medo de retaliações ou sansões dos serviços de proteção à criança. Neste contexto, vale ressaltar que as múltiplas identidades sociais no nível micro (por exemplo, raça, sexo ou classe social) de mulheres usuárias de substâncias estão ligadas a desigualdades nos níveis macro e estrutural (por exemplo, racismo, sexismo, misoginia e pobreza).
Dentre as intervenções universais sabidamente reconhecidas para a prevenção do suicídio, destacam-se a restrição aos meios de suicídio (controle de armas de fogo, por exemplo), a redução do uso prejudicial de álcool e outras drogas e a conscientização da mídia para comunicação responsável sobre o tema.
Todos estes argumentos parecem justificar a importância de se entender o estigma social e as diferenças do tratamento entre homens e mulheres dependentes de substâncias para diminuir o suicídio. Os problemas de abuso de álcool e outras drogas relacionados ao gênero estão não apenas nas diferenças biológicas, mas também a fatores sociais, culturais e ambientais, que podem influenciar a apresentação clínica, as consequências do uso e as abordagens de tratamento, prevenção e das políticas públicas voltadas as especificidades de mulheres.