Como você fala importa e muito!
Autor: Marvim Pereira
Você já se perguntou qual é a melhor forma de se referir as pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade, seja ela biológica, psicológica ou social, decorrente do uso de substâncias?
Eu sou Marvim Pereira, tenho 32 anos, atualmente sou Conselheiro Terapêutico Hospitalar e sou um recuperando lutando todos os dias para lidar com um *Transtorno causado pelo uso de substâncias e quero aqui trazer para você o olhar de um Dependente Químico sobre o estigma que ainda existe em nosso meio quer seja na forma que se referem a usuários de drogas ou quer seja na abordagem aos usuários com relação a pessoas como eu.
Não é novidade que pela desinformação, pelo preconceito e até mesmo pela baixa educação acadêmica, a sociedade ainda tende a colocar os seres humanos em caixas com rótulos. Falamos e ouvimos pessoas citarem momentos de pânico e desespero em decorrência da marginalização existente no padrão de comportamento de alguns indivíduos acometidos pelo Transtorno por Uso de Substância, conhecido atualmente pela sigla TUS.
Vamos imaginar o seguinte cenário no qual durante o atendimento no serviço de saúde qualquer, um profissional atende no mesmo dia vários usuários com necessidade de diagnósticos e tratamentos das mais diversas morbidades psiquiátricas. Esses usuários certamente possuem singularidades diversas. Dentro deste contexto, a prática da comunicação, ou seja, a interação entre o transmissor e o receptor, chamados de interlocutores, ocorrem por meio de regras e signos mutuamente entendíveis para que esta comunicação ocorra a contento. E é aqui que quero chamar a sua atenção, pois quais são os signos que você está abordando na sua parte de comunicação com seu paciente? Mas de fato, você como parte integrante deste cenário de auxílio ao indivíduo que busca ajuda para interromper o uso ou mesmo aquele sujeito que está lá na cracolândia e ainda não está sequer conseguindo pedir ajuda, você tem conseguido perceber quando está realmente agindo de maneira empática, respeitosa e solidária com este público? Ou por vezes, você usa termos que estão presentes no cotidiano dos jornais, nas mídias sociais ou nas conversas coloquiais com amigos sem sequer perceber que pode estar perpetuando estigmas a esta população?
Durante muito tempo carregamos características de estigmas e preconceitos na história da humanidade, os quais são também reproduzidos na linguagem. Jargões usados em grupos de mútua ajuda ao mesmo tempo que parecem poder aproximar o entendimento de determinada realidade, podem também aumentar estigma, preconceito e em última instância afastar a busca de tratamento. Termos como viciado, noia, pé de cana, cachaceiro, noiado, drogado, vicio, bebum e maconheiro devem ser desestimulados fortemente do nosso vocabulário, pois a linguagem importa muito e tudo isso só reproduz um modelo ultrapassado e, muitas vezes, moralista de olhar esta pessoa que está sofrendo devido ao uso de substâncias.
Na versão do DSM-V a terminologia atual utilizada “Transtorno por Uso de Substâncias” vem para tornar este fator menos estigmatizante e auxiliar no reconhecimento de uma doença de natureza crônica e também para se fazer entender que os termos são para que indivíduos possam ser acolhidos e ajudados e não punidos. Não devemos punir aqueles que estão em vulnerabilidade com um vocabulário carregado de desamor, desafeto e porque não dizer ódio.
Pense nisto! Reflita e coloque em prática a mudança do seu vocabulário.