Autor: Vinícius Marinacci Cardim

O Transtorno por Uso de Substâncias (TUS) é um fenômeno complexo cuja origem está relacionada a diversas vulnerabilidades presentes em um ou mais fatores de ordem biopsicossocial. Por meio de uma compreensão mais profunda destes fatores, é possível entender os motivos que levam uma pessoa a progredir da experimentação para ouso abusivo e daí para a dependência de substâncias. Neste sentido, vale destacar que a gênese deste transtorno vai além de meros comportamentos relacionados à obtenção e utilização de drogas. Tais comportamentos representam apenas a superfície de um problema muito mais amplo que envolve diversas áreas de vida de uma pessoa.

A complexidade inerente ao TUS implica que profissionais engajados em seu tratamento precisam formular estratégias efetivas que culminem em amplas modificações no estilo de vida do usuário, bem como que proporcionem maior resiliência e autoeficácia diante das diversas situações que impelem riscos a sua recuperação. Dentre as estratégias disponíveis para o manejo do TUS, evidências cada vez mais consistentes apontam que as intervenções compostas por uma variedade de técnicas cognitivas e comportamentais (TCC)podem beneficiar os indivíduos acometidos pelo TUS e, de igual modo, proporcionar desfechos mais positivos para ocurso do tratamento e manejo deste transtorno.

As TCC partem da concepção de que o uso de sustâncias é estabelecido por padrões de comportamentos aprendidos que emergem do aprendizado social. Em outras palavras, quer dizer que o consumo de substâncias pode ser compreendido a partir de comportamentos que o indivíduo aprende através das observações realizada sem seu meio sobre os modelos e padrões de comportamentos disponíveis ao seu redor. No curso do aprendizado e desenvolvimento destes comportamentos, os processos advindos do condicionamento respondente (aprendizado através do pareamento de estímulos) e condicionamento operante (aprendizado através das consequências) também exercem grande influência e, portanto, também merecem destaque. Sabe-se que tanto as situações prévias que, por repetidas vezes, anteciparam a ocorrência destes comportamentos, bem como as consequências que os sucederam, sejam por reforço positivo (obtenção de prazer), seja pelo reforço negativo (redução do desconforto),influenciam em grande parte a recorrência destes comportamentos em situações similares no futuro.

De modo intrínseco ao contexto e ambiente, o uso de substâncias pode ser motivado por um sistema de crenças disfuncionais que o indivíduo desenvolveu previamente ao consumo de substâncias. Tais crenças estão relacionadas ao seu histórico de vida e interferem sobre a percepção de si mesmo, de outras pessoas e do mundo. Este processo, denominado de vulnerabilidade cognitiva, representa uma condição de risco prévia para o desenvolvimento de um novo grupo de crenças que, secundário ao uso de substâncias, influenciará nas expectativas que se espera atingir em decorrência do consumo de substâncias. É neste ponto que o indivíduo passa a atribuir aos efeitos das substâncias uma série de expectativas sobre certas causas e efeitos que não dependeriam necessariamente do consumo para ocorrer; como por exemplo: reduzir o estresse, manejar a raiva, lidar com os problemas e solucionar os conflitos, baixar a timidez e aumentar a autoestima, amenizar a ansiedade e depressão e, até mesmo, obter prazer e diversão.

Como proposta interventiva às condições expostas, as técnicas cognitivas e comportamentais objetivam proporcionar uma ampla modificação no estilo de vida do usuário. Além disso, dão ênfase para a identificação e modificação de distorções cognitivas, assim como para a substituição de padrões desadaptativos por padrões adaptativos de crenças e expectativas disfuncionais. Estas técnicas também objetivam aumentar a autoeficácia através da identificação de possíveis situações de risco para a recaída, sejam elas internas (pensamentos e sentimentos) ou externas (lugares e pessoas), bem como através do desenvolvimento de novas estratégias de enfrentamento, tanto cognitivas quanto comportamentais, destinadas a capacitar o indivíduo a lidar de modo mais assertivo com situações similares no futuro.

Neste sentido, vale destacar que a Prevenção da Recaída e o Treinamento de Habilidades Sociais são recursos advindos das TCC que apresentam resultados satisfatórios diante dos objetivos anteriormente citados. Em relação à sua aplicabilidade, as TCC podem ser realizadas através de um conjunto de sessões semiestruturadas que são objetivas e orientadas para metas específicas. O tratamento é baseado em quatro componentes essenciais, sendo eles: relacionamento terapêutico colaborativo, conceituação cognitiva do caso, estruturação das sessões e aplicação de técnicas cognitivas e comportamentais que, por sua vez, podem ser realizadas tanto na modalidade grupal como individual.

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