Autora:  Alessandra Diehl

Dentre os muitos desafios enfrentados pela pandemia da COVID-19 estão os efeitos sobre o consumo e uso nocivo de álcool, os quais ainda não são totalmente conhecidos, principalmente na população feminina. Vários estudos internacionais relataram aumento do consumo de bebidas alcoólicas durante a pandemia sendo que o consumo de álcool entre as mulheres já era um crescente problema na área da saúde pública antes mesmo da pandemia se instalar no mundo.

Imensos desafios e possibilidades de transformações sociais para a humanidade vêm sendo colocados à prova para a população mundial a ponto de da pandemia da COVID-19 ter sido considerada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como uma ameaça potencialmente mais poderosa do que o terrorismo. Dentre esses muitos desafios enfrentados por esta pandemia estão os efeitos sobre o consumo e uso nocivo de álcool, os quais ainda não são totalmente conhecidos.

No Brasil, dados obtidos pelo estudo “Convid pesquisa de comportamentos”, conduzido pela Fiocruz nos meses de abril a maio de 2020, mostraram que 25,6% das pessoas entre 30-39 anos relataram aumento do consumo de bebidas alcoólicas durante a pandemia. O maior aumento ocorreu entre os adultos jovens, porém chama a atenção também o consumo de sêniors e idosos tiveram aumento de 11,4%. Outro estudo, conduzido pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) com 12.328 participantes da América Latina e países do Caribe, apontou um aumento do consumo de álcool da ordem de 13,2%. Dados preliminares do Global DrugSurvey (GDS), conduzido durante a pandemia, revelam que a média global de aumento de consumo de álcool na forma de binge (5 ou mais doses em uma única ocasião) durante a pandemia (maio a junho de 2020) foi de 13,5%, com maior aumento em países como Irlanda (21,8%), Nova Zelândia (20,7%) e Reino Unido (20,6%) e Brasil (13,1%).Nenhum destes estudos, divulgaram até o momento artigos com um recorte para o público feminino.

No entanto, um estudo realizado via web, durante a pandemia, por Boschuetz et al. (2020) nos Estados Unidos da América (EUA), com 417 indivíduos, nos quais 83% eram mulheres, apresenta dados de que as pontuações no teste de rastreio para problemas associados ao uso de álcool foram estatisticamente maiores em mulheres, com aumento também na frequência e a quantidade ingerida aumentaram, inclusive o uso antes das das 17 horas. O estudo também trouxe dados de que mulheres, filhos em casa e história de abuso de substâncias foram fatores de risco que podem estar diretamente relacionados ao aumento do uso de álcool.

Outro estudo realizado via web na Bélgica por Vanderbruggen et al., (2020), com 3.632 indivíduos, sendo 70% mulheres buscou investigar o aumento do álcool, tabaco e maconha durante a pandemia de COVID-19, corroboram os achados no estudo de Boschuetz et al., (2020). Os participantes relataram apresentar aumento no uso de álcool e tabaco, enquanto não foi observada nenhuma mudança significativa no consumo de maconha. Indivíduos mais jovens, ter filhos em casa, trabalhadores fora da área da saúde e ser desempregado tiveram maior associação com o uso de álcool.
Ainda no Brasil, um estudo realizado por Garcia et al. (2020) apresentam dados alarmantes dos efeitos negativos do consumo do álcool na pandemia, tendo como tema principal a violência familiar e doméstica, nas quais as maiores vítimas são mulheres e crianças. O estudo mostra que entre os dias 1-16 e 17-25 de março de 2020 observou-se 18% de crescimento no número de denúncias através do Disque 100 e Ligue 180. Os feminicídios também tiveram suas taxas aumentadas em vários estados. Especificamente em São Paulo, o número de casos, em março de 2020, alcançou os 46,2% superior ao mesmo mês no ano anterior. Já no Mato Grosso, quintuplicaram os números de feminicídios. O álcool esteve sempre presente nessas situações e as mulheres sobreviventes, apresentam chances aumentadas para o uso de álcool como estratégia de enfrentamento para lidar com a situação de violência.

Mulheres com alcoolismo são mais propensas do que os homens a enfrentar várias barreiras e vulnerabilidades que afetam o acesso e a permanência delas no tratamento para a dependência química. Mulheres frequentemente iniciam o a consumo de álcool para aliviar problemas de saúde mental pré-existentes, incluindo altos níveis de estresse, sentimentos de alienação, sintomas de depressão e ansiedade ou transtorno de estresse pós-traumático (TEPT). Essa estratégia de automedicação não adaptativa geralmente resulta em uma transição mais rápida para o uso regular de álcool e, eventualmente, em uma dependência mais grave.

Promover prevenção e aumentar a promoção de saúde para este público e também aumentar a organização de serviços que sejam especializados nas demandas do público feminino acometidos pelo uso de álcool e outras drogas são necessidades urgentes diante deste cenário epidemiológico crescente.

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