Nossa compreensão sobre as causas do uso e dos danos causados pelo álcool e outras drogas expandiu enormemente nos últimos 20 anos. Em particular, as teorias etiológicas tornaram-se substancialmente mais complexas, incorporando pesquisas sobre o desenvolvimento humano e os determinantes sociais da saúde. Os avanços na neurociência também melhoraram nosso conhecimento sobre o impacto do uso de drogas ilícitas no cérebro do adolescente, por exemplo, que nos sinalizam mudanças em direção a uma abordagem transdisciplinar para cuidar deste fenômeno tão complexo.
No entanto, vários desafios ainda persistem nas áreas das adições, entre eles destaca-se como os pesquisadores podem traduzir seus importantes achados de pesquisas científicas em políticas públicas. A lacuna fundamental no conhecimento, no entanto, não se limita a ‘o que fazer’, mas sim ‘como’ traduzir as descobertas científicas em programas eficazes e sustentáveis para determinados grupos e para a população como um todo.
Apesar de muitas evidências sugerindo de que traduzir a pesquisa em políticas de saúde pública é mais complexa do que os modelos lineares e cíclicos, as partes interessadas muitas vezes recorrem a teorias heurísticas, ou seja, formas abreviadas de pensar que permitem respostas simples, mas imprecisas, a problemas complexos. Isso leva a oportunidades de impacto potencialmente perdidas, como a realização de pesquisas em colaboração com os formuladores de políticas públicas locais e a contribuição de ideias para uma narrativa mais ampla por meio da mídia e do envolvimento do público. O processo de tradução da pesquisa em ações que resultem em algum impacto para a sociedade parece envolver uma abordagem planejada visando múltiplas rotas para que este impacto seja alcançado e sustentado ao longo do tempo.
Entre as barreiras para que isto aconteça podemos citar:
a) a complexidade dos determinantes sociais,
b) atitudes da comunidade, e questões ligadas a
c) governança e estruturas de financiamento de cada país.
Os desafios são de fato substanciais, mas não intransponíveis. A pesquisa sobre os determinantes sociais do uso e danos causados pelas substâncias psicoativas está construindo uma base de evidências capaz de informar a política. No entanto, uma liderança que acredita em ciência e em boas práticas clínicas é extremamente necessária para transformar as prioridades de financiamento de projetos de curto prazo com foco em mudanças de nível individual para abordagens mais amplas e de longo prazo.
Este será o tema da palestra magna do nosso convidado internacional Dr Raul Caetano e do nosso primeiro presidente Dr Jose Manoel Bertolote durante o XXVII Congresso da ABEAD que será realizado de 3 a 6 de setembro na cidade de São Paulo no Centro de Convenções Rebouças. Dr. Raul é médico (UERJ), Psiquiatra (UFRJ), Mestre em Ciências do Comportamento e Doutor em Epidemiologia (Universidade da Califórnia, Berkeley), Professor Emérito de Epidemiologia da Escola de Saúde Pública, Universidade do Texas, Cientista Sênior, Centro de Pesquisas em Prevenção, Berkeley, Califórnia e o Dr. Jose Bertolote é médico, Especialista em Psiquiatria (ABP), Mestre em Psiquiatria Social e Transcultural (McGill), Doutor em Clínica Médica (UFRS), Especialista em DQ (ABEAD). Professor Voluntário, Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP. Custódio Nacional de A.A.